FESTA MODA SEM CRISE – O direito à liberdade é uma das garantias propostas aos cidadãos brasileiros pelo Artigo 5º da Constituição Federal. E essa mesma liberdade está impressa na primeira coleção da marca Simplesmente dos jovens estilistas Samela Araujo, de 19 anos, e Caio Nunes, 21, que leva também este nome: Artigo 5º. Na última sexta-feira, Samela e Caio exibiram suas criações masculinas e femininas em um desfile surpresa que mexeu com a emoção dos convidados da festa de aniversário de 1 ano do site Moda Sem Crise, dando brilho e ainda mais sentido à comemoração. O desfile contou com a produção de Relberth Rodrigues.
Os conheci durante cobertura da 5ª edição do projeto Periferia Inventando Moda (PIM) que ocorreu em novembro do ano passado, aqui mesmo em São Paulo. Não foi à toa que a garota que na ocasião, pouco antes de lançar literalmente na passarela sua coleção, vestia uma camiseta branca com a frase “JÁ QUE É PRA TOMBAR” em letras garrafais chamou a atenção. Durante a abordagem e entrevista nos bastidores do PIM ficou claro que estava diante de uma talentosa e engajada profissional de moda.
Uma das vertentes do Moda Sem Crise é pautar e evidenciar o trabalho de novos designers com o objetivo de dialogar e contribuir com a moda brasileira. E Samela e Caio tem todo o nosso respeito. Conversei na tarde de ontem com o casal sobre planos, engajamento e geração tombamento.
Sobre a primeira coleção, lançada com a marca durante o PIM, Samela explica que a inspiração surgiu justamente da leitura do Artigo 5º da Constituição Federal que prevê, entre outros direitos aos cidadãos brasileiros, o direito à liberdade. “Artigo 5º tem a ver com o Artigo [5º da Constituição Federal] mesmo. Esse artigo fala que somos livres, somos libertos para nos expressarmos, para sermos quem realmente somos, e nele tem uma frase muito interessante que fala que não somos obrigados a nada. Que podemos ir do jeito que quisermos e voltarmos da maneira que quisermos. Então foi justamente por isso que a gente colocou o nome Artigo 5º na coleção.”
Segundo a estilista, o conceito da Simplesmente é ser diferente e mostrar que o simples é bonito. “Queremos mostrar que o que importa talvez nem seja o que você está vestindo, mas a maneira como você está consigo mesmo. Usamos a paleta nas cores cinza, preto e branco com o objetivo de ressaltar a pessoa e não exatamente a roupa. Nossa proposta é mostrar o poder da pessoa. É mostrar que a gente pode ser quem a gente quiser”, afirma Samela em um discurso afinado com a chamada geração tombamento.
O resultado de toda essa atitude tem refletido no negócio. Com apenas três meses de existência, a Simplesmente tem sido recebida de braços abertos pelos clientes e tem surpreendido o casal afro-empreendedor. “Os clientes se identificam com a marca é coisa de louco. [A aceitação] está sendo maior do que pensávamos. Supera totalmente as nossas expectativas. Achávamos que só depois de seis ou oito meses aconteceria todas essas vendas. Isso sem falar em todo o carinho que muitas pessoas têm pela marca”, comemoram os estilistas.
Amor à primeira vista
Moradores da Zona Leste de São Paulo, Samela que é de Salvador (BA) e o namorado Caio, nascido no Rio de Janeiro (RJ) dividem os trabalhos da marca lançada em novembro. Caio é quem desenvolve a coleção masculina e cuida das questões financeiras do negócio. Já Samela é responsável pela criação da coleção feminina. E é quem cuida do relacionamento com a imprensa e participação em eventos e ensaios. O casal se conheceu em uma festa. Samela afirma que o que os uniu foi a música, mas a moda tem feito com que estreitem cada vez mais os laços.
A experiência da jovem com a moda vem desde a infância e tem origem familiar. Aliás, seus pais os ajudam em muitas coisas. Já Caio tem uma história recente no ramo. “Eu não tinha até então nenhum envolvimento com a moda. Tinha vontade de abrir uma loja, mas não de uma marca própria. Tinha metas e objetivos e sabia que no fundo estava faltando algo. Sempre gostei de ser diferente, mas nunca tinha me imaginado no mundo da moda. Até que eu conheci minha rainha Samela, e assim como foi por ela tive amor à primeira vista com o mundo da moda. Foi minha primeira marca, minha primeira coleção, primeiro evento, primeiro contato com a moda, hoje eu sei o que faltava”, conta o apaixonado Caio que trabalhava anteriormente na construção civil. “Aprender sobre uma nova área não é tão fácil assim, mas a cada dia estudo mais, me esforço mais, e tenho aprendido coisas novas a cada segundo. Mas eu tenho sorte de ter uma professora maravilhosa e cheia de bagagem ao meu lado e que posso chamar de vida”, completa.
Planos para o futuro
A parceria entre Caio e Samela deve ir longe. Entre os planos do jovem casal está o envio da Simplesmente para suas cidades de origem, Rio de Janeiro e Salvador, respectivamente, e para fora do Brasil.”O primeiro pensamento é fechar uma parceria com a AFROPUNK* e levar a marca para os Estados Unidos e França. Meta que temos para este ano. E temos um projeto social que até o fim do ano estará de volta. A marca tem tomado muito nosso tempo. Queremos primeiro conquistar espaço para depois articular o projeto. Outra meta é transformar pessoas sem condições e que não se descobriram e oferecer peças e promover ensaios fotográficos.
*AFROPUNK é uma comunidade influente de pessoas jovens e talentosos de todas as origens que falam através de música, arte, cinema, comédia, moda e muito mais. Originando com o documentário de 2003 que destacou uma presença negra na cena punk americana, é uma plataforma alternativa e experimental. Permanecendo no centro de sua missão estão os princípios punk da estética DIY [faça você mesmo], pensamento radical e não-conformidade social. AFROPUNK é uma voz para o não-escrito, indesejado e inédito.
Geração Tombamento
O sociólogo francês, Gilles Lipovestsky defende que a moda é um espaço social onde é possível exercer a liberdade e a maneira crítica de enxergar o mundo. E a geração tombamento tem se apropriado da moda e, mais do que um simples movimento estético urbano, tem buscado pela representatividade, empoderando e fortalecendo assim a cultura negra a elevando a outro nível.
De acordo com a Enciclopédia Jurídica, tombamento é um ato com o propósito de preservar, via legislação especial, bens caracterizados como de valor histórico, arquitetônico, cultural, ambiental e de valor efetivo para a população impedindo, assim, que venham a ser descaracterizados ou alvo de destruição. E a gíria tombar que tem ganhado força tem tudo a ver com isso. Não se trata apenas de arrasar, mas preservar e favorecer a cultura afro-brasileira.
“A atitude dos jovens está se renovando. Os jovens não querem saber se tem obstáculos, hoje ele vai pra cima e acabou. Pra mim a geração tombamento é mostrar que podemos ser o que quisermos”, diz Samela. “Quando a gente sai na rua,as pessoas ficam nos olhando torto, como se pensassem ‘para onde eles pensam que estão indo’. E para muitos a geração tombamento é simplesmente tombar. Mas, é muito mais. É mostrar para que veio. É simplesmente ser livre, simplesmente mostrar que podemos tudo”, completa Caio.
Confira as fotos do desfile [Fotos: David Ferreira]
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