23 • junho • 2016

Empoderamento feminino: A mulher negra como fator ativo de mudança


Empoderamento feminino: A mulher negra como fator ativo de mudança

Beth Moreira posa para editorial sobre moda afro (Foto: Celso Leal)

COMPORTAMENTO – Filha de Maria e Vicente, a assistente social Elisabeth da Silva Moreira, 38 anos, nasceu e foi criada com seus sete irmãos em uma casa de periferia em São Paulo. Negra. Viveu na pele as dificuldades enfrentadas em um país de desigualdade racial e social. Linda. O próprio reconhecimento só aconteceu após se enxergar por meio das lentes de uma amiga fotógrafa. Um ensaio fotográfico mudou sua história, sua percepção de si mesma. E a tem feito não só brilhar, mas representar e empoderar a si e a outras mulheres por este Brasil inteiro.

A vida profissional de Beth começou quando ainda era uma adolescente. “Aos 13 anos comecei a trabalhar como aprendiz e conciliava com a escola. Casei aos 21, aos 30 tive uma filha, e, aos 34 me divorciei”, disse Beth que neste período resolveu que deveria mudar algumas coisas e conquistar outras. “Entrei na faculdade, trabalhava, tinha muitas responsabilidades. Foi um tempo de muitas lutas”, contou. Lutas inclusive em relação ao corpo. “Tinha e ainda tenho alguns conflitos, sempre tive variação de peso e após a gravidez o corpo mudou. Era difícil aceitar as estrias, o metabolismo lento e o peso extra”, comentou.

A “descoberta” de sua beleza ocorreu quando a amiga Daniela Rodrigues Oliveira a convidou para um ensaio fotográfico em Paranapiacaba, Região Metropolitana de São Paulo. “Ela me achou bonita. Quando vi o resultado [das fotos] fiquei surpresa e encantada com aquela mulher linda retratada. A partir desse dia comecei a gostar dos clicks e da minha imagem. Antes eu não me via assim, acredito que não parei para me observar, ficava focada no corpo e não enxergava meu rosto e as fotos despertou isso. Por isso destaco a importância da sensibilidade do olhar do fotógrafo, focar no detalhe, naquilo que temos de melhor. E após esse ensaio comecei a receber muitos elogios e isso elevou a minha autoestima. Ressurgiu uma linda mulher, me olhei com mais brilho”, contou.

Os convites continuaram a chegar. Beth contou ao Moda Sem Crise que após esse ensaio, surgiram outras propostas por permuta. “E a cada resultado percebi que muitas mulheres negras, começaram a se identificar dizendo ‘nossa como você é uma negra linda… difícil ver fotos assim…’ Nascia nesse momento um papel de representatividade e uma nova modelo. E isso foi maravilhoso porque encarei como hobby, pois estava ali por prazer e não me importava tanto em não ter o corpo perfeito”, disse ela que mais do que nunca entende seu papel e a importância de sua participação em campanhas e peças publicitárias. “Eu represento uma grande parcela do estereótipo da mulher brasileira que tem altura mediana, negra ou afrodescente e acima do peso e na faixa dos 30 aos 40 anos, essa é a nossa realidade que não parece na mídia na proporção que se é devida”.

Mais do que fotos, o trabalho que essa assistente social tem se dedicado, como modelo, tem sim a ver com empoderamento e representatividade. Sua imagem retrata e valoriza a beleza negra. Processo que a fez mudar por dentro e por fora. “Decidi encarar a transição capilar, aceitando-me e valorizando o cabelo que Deus me deu. Pois ele é perfeito na sua criação. Fico muito feliz de saber que meu papel de modelo vem transformando olhares, transformando vidas. Porque é muito bom ver uma mulher negra olhar para você, dizer como você é bonita, inteligente e se convencer: ‘e sei que posso ser assim também’ . Nesse momento eu instruo, tento ser ponte, ajudo na reflexão e aos poucos pelo meu caminhar, outras novas mulheres e olhares vão surgindo. Como eu sempre digo: Devemos florir onde Deus nos plantar”, completou.

A mulher negra e suas relações de poder

“A mulher negra hoje está inserida timidamente em alguns cargos de destaque, ainda há muito preconceito, racismo, falta de oportunidades e diversos fatores advindos do nosso processo de escravidão. Tivemos alguns avanços, mas precisamos de muito mais”, disse Beth Moreira, que embora não negue esforços quando o assunto é empoderamento e representatividade da população afrodescendente, explica que muito ainda precisa melhorar. “Temos muitos espaços a ocupar. Desejo entrar em um estabelecimento bancário e ver mulheres negras ocupando cargos de gerencia, em companhias aéreas, nos consultórios médicos, em propagandas, na mídia, empresárias, no governo e em todos os espaços e esferas. Numa quantidade que seja equivalente a nossa população. Temos muito que avançar, o Sistema nos deve e como deve, somos  um povo que foi escravizado, explorado, jogado a margem e essa exclusão se perpetuou por muitos e longos anos. A divida com a nossa história é muito grande, ainda há muito que incluir e muitas esferas a ser representada”, disse.

A luta de Beth é a luta de todas nós. A luta por justiça social. A luta de ser ponte. De servir como inspiração e reflexão. “É demostrar para a mulher negra que ela é linda, que se há oportunidade ela aprende, cresce, se desenvolve, é competente e merece estar em todos os lugares, ocupando diversas funções. Que a minha luta, também é a luta de muitas e que as minhas pequenas conquistas, também pode ser as delas. Não é fácil eu confesso, más é possível. Meu trabalho não é só a beleza pela beleza, tudo tem um significado. E cada ensaio fotográfico traz um pouco da nossa cultura, a questão racial e a inclusão. Algo que vem a repercutir com a minha formação que é de buscar garantir os direitos humanos e sociais”, completou.

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As modelos Beth Moreira e Liliane Caetano posam para o fotógrafo Celso Leal em São Paulo




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