24 • abril • 2017

Sobre o alcoolismo: assunto que não se pode ignorar


CAUSE MARIA – Todos os que me acompanham e me seguem nas redes sociais e na vida sabem o quanto gosto de beber drinks e sempre dou um jeito de conhecer e experimentar novos. Tenho amigos “drinkeiros” e uma irmã que sempre deixam as minhas festas mais divertidas e com bebidas maravilhosas. O que poucos sabem é sobre a minha aversão ao alcoolismo e ao descontrole gerado por ele. Um pouco contraditório, mas é a verdade. Convivi com o alcoolismo em casa desde que nasci. Não me lembro,  até os meus 26 anos, de não ver o meu pai envolvido nisso.

Por sempre trabalhar muito, nós pouco o víamos. Foi pedreiro e mestre de obras e trabalhava constantemente para ter sua casa própria, suas contas pagas, dar o primeiro carro a cada um dos seus filhos, além da carta de motorista e também ajudar a dar o pontapé inicial na faculdade para que depois custeássemos com o nosso próprio trabalho. E assim foi. Nas poucas horas de folga, só lembro de vê-lo sempre bêbado. Então, sempre temíamos os finais de semana, feriados e datas comemorativas, pois sabíamos que o negócio não seria bom.

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Número de mortes pelo álcool supera Aids, Tuberculose e violência juntos. Consumo de bebidas alcoólicasmatam 3.3 milhões de pessoas por ano, segundo Organização Mundial da Saúde (OMS) – Foto: Pixabay

Sua maior vítima: minha mãe. Nunca foi agredida fisicamente e isso, na verdade, porque nunca permitiu. Mas as agressões verbais eram frequentes e sempre se estendiam a nós.

Ela, por sua vez, sempre nos ensinou a respeitá-lo. “Dizia: é seu pai!” E essa doutrina, trouxemos para a vida toda.

Amigos, jamais podiam frequentar a nossa casa, como fazem atualmente. Namorados então, nem pensar. Horário para chegar em casa? Era melhor nem sair, porque já sabíamos que isso custaria bem caro.

Quando tento puxar lembranças iniciais da minha vida, lembro desse cenário, por isso, não sei exatamente como tudo começou. Perguntando a minha mãe, ela diz: “Sempre foi assim. Nos casamos, ele me trouxe para São Paulo – pois são de Minas Gerais –  E, assim que cheguei aqui, ele se transformou nessa pessoa.”

Então, não sabíamos o motivo, se é que há qualquer motivo para justificar isso. Por ele, jamais saberíamos, mesmo porque, meu pai nunca foi de muita conversa, de nos contar histórias sobre sua vida, sobre sua infância, adolescência. Ouvíamos coisas aqui e ali, quando conhecíamos ou visitávamos parentes da mesma época.

Quando se aposentou, a situação tornou-se ainda pior. Tinha muito tempo livre, mais tempo para ficar bêbado. E tornar tudo insustentável.

Nunca desabafamos com pessoas de fora. Nos cuidávamos e ouvíamos entre nós mesmos. Mas chegou-se a pensar em sairmos todos de casa e deixá-lo morar sozinho. Não aceitei a opção. Ele já estava com mais de 60 anos. Bebendo daquele jeito, poderia ficar muito doente. Na certa, nos arrependeríamos.

Minha mãe o enfrentava muito e não deixava barato a situação. Eu me orgulhava disso, mas ao mesmo tempo tinha medo de em algum momento, pudesse acontecer alguma briga grande sem nós, filhos, estarmos por perto.

Lembro da última vez que o vi bêbado. Tínhamos um casamento de um “primo” do qual os dois seriam padrinhos. Mesmo com esse evento importante, ele estava bêbado e sempre com palavras agressivas dirigidas a nós e principalmente a minha mãe. Nesse dia, a coisa foi tão séria, que tivemos que levá-los para o salão da festa, cada um em um carro. Meu irmão dirigindo um e eu o outro.

Na semana seguinte, decidi chamá-lo para conversar. Falei algumas coisas que pensava a respeito daquele comportamento. Citei coisas positivas na vida dele como tudo o que havia conquistado financeiramente, a família que o amava e respeitava, apesar de tudo, os filhos, que decidiram seguir apenas os melhores exemplos dele que são: lutar pelos objetivos mesmo que pareçam distantes, sempre trabalhar por isso e ser honesto.

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Alcoolismo é uma doença e quem sofre direta ou indiretamente pode e deve procurar ajuda. Neste link do Ministério da Saúde – Área Temática você encontra o contato de serviços de apoio em todos os Estados brasileiros. Há ainda uma central telefônica gratuita e aberta à população de todo o país, para orientar e prevenir o uso de álcool e outras drogas, disponibilizada pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (SENAD): LIGUE 132 – Foto: Pixabay

E tentei descobrir o motivo de tudo aquilo, mas não consegui. Nessa ocasião, falei sobre como o alcoolismo nos afetava como família, e o quanto me afetava pessoalmente. Da nossa preocupação com esse comportamento em lugares onde não fosse conhecido e as pessoas pudessem também agredi-lo ou até matá-lo. Fora isso, a saúde poderia e iria ser prejudicada, pois já passava dos 60 e beber constante não seria uma coisa recomendada.

A conversa foi longa, pensei que não surtiria resultados, mas não lembro de ver meu pai beber depois desse dia. E já se passaram 11 anos. Se refletiu e decidiu parar por causa do nosso papo, não sei. Se decidiu sozinho e cansou de tudo, também não sei. Não o vejo beber nem socialmente, mesmo que esteja com algum amigo que beba e ele o sirva. Agradeço muito a Deus por essa mudança.

Foram 26 anos da minha vida, que hoje me trazem algumas dificuldades de lidar com o descontrole e o alcoolismo. Quando estou próxima de alguém com tal comportamento, sinto-me tão afetada a ponto de me dar desespero e querer sair, fugir, correr, ir embora, desaparecer. Desespero tão grande, que já deixei de sair e confraternizar com diversos amigos com tal comportamento. Medo de relacionamentos parecidos com o que cresci observando em casa, o que me afastou por muito tempo do desejo de me relacionar de fato com alguém.

Isso também faz com que eu seja uma pessoa que está sempre se policiando e não que não se permite jamais avançar o sinal, quando o assunto é álcool. Por isso, embora seja adepta dos drinks, nunca ultrapassei meus limites e entro em pânico quando penso em ultrapassá-los.

Algumas marcas me serviram para o bem e outras me tornaram pouco compreensiva e intolerante com as pessoas quando o problema é este.

Sei que não sou exclusiva no tema, muitas pessoas passaram e passam por isso constantemente e cada um tem a sua forma de lidar. Mas compartilhar, acho que é uma forma de mostrar que problemas existem mesmo não sendo expostos e que podemos utilizá-los para o nosso bem, tirando deles apenas o aprendizado e trilhando caminhos para nos distanciarmos cada vez mais deles.

Estamos trabalhando, as marcas não são apagadas mas o caminho é sempre para frente!

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