COMPORTAMENTO – A recente criação de bonecas, por exemplo, de pele negra está indo na contramão de uma indústria ainda dominada por bonecas de pele branca e cabelos loiros. Avanço do empoderamento negro que estimula o respeito à diversidade. Outras iniciativas louváveis começam a aparecer, seja representando um aspecto físico, seja representando questões de saúde, como é o caso das bonecas diabéticas, das quais falamos em novembro. Segundo especialistas, crescer tendo brinquedos como espelho é positivo e de extrema importância. Aquilo que se aprende e vivência na infância serve de alicerce para outras fases da vida. 2016 seguiu uma tendência que vem dando sinais. E se mostrou um ano bastante “disposto a colaborar com a mudança do cenário”. A expectativa é que 2017 se revele em sintonia com o debate que cada vez mais cobra por representação ao tocar em assuntos como os padrões de beleza, feminismo, quebra de esteriótipo e diversidade.
Criada por uma empresária de origem congolesa, Mushiya Tshikuka, que hoje mora nos Estados Unidos, a linha de bonecas “My Natural Doll” tem a missão de ajudar as crianças a perceberem a própria beleza. “Em um mundo onde as bonecas com as quais brincamos moldam nossa percepção de beleza e constroem nossa autoconfiança, é importante que as meninas estejam expostas ao seu próprio tipo de cabelo assim que ele começa a crescer”, diz a descrição da boneca. Recentemente quem também lançou no Brasil um projeto semelhante foi a marca Estrela. Em parceria com as lojas Ri Happy e o Fundo para Equidade Racial (Fundo Boabá), a coleção foi batizada de Adunni que em nígero-congolês Yorubá, quer dizer “a doçura chegou ao lar”.
“Para uma menina, ganhar uma boneca negra que reflete suas características físicas, que via de regra não são vistas como padrão ou sinônimo de beleza pela sociedade, vai muito além de um simples brinquedo. Esta boneca pode gerar uma conexão afetiva que vai além do conceito lúdico; ela reflete a identidade da criança, fazendo com que ela se sinta representada na boneca negra. Reconhecer a própria identidade em um brinquedo é fortalecer a autoestima da criança. Estes foram os motivadores para a criação da linha Adunni, que na Língua Iorubá significa a doçura chegou ao lar”, explica Selma Moreira, Diretora Executiva do Fundo Baobá.
Detentora da marca Barbie, a Mattel, em 2016, adotou a medida inédita contra a ditadura dos padrões estéticos ao anunciar a criação de novos formatos de corpo e cor de pele e cabelo. Durante os 57 anos de sua história, a Mattel manteve como padrão para suas bonecas o corpo alto, magro, com pele de cor branca, olhos azuis e cabelos loiros, em sua maioria.

Bonecas da coleção exclusiva Adunni: no site da Rihappy as duas aparecem com o status “esgotado” – Foto: Estrela/Ri Happy/Divulgação
O Moda Sem Crise pediu a uma de nossas parceiras, a psicóloga carioca Maria Cristina Ramos Britto que escrevesse sobre o assunto. Especializada em terapia cognitivo-comportamental e autora do blog Saúde Mente e Corpo, a profissional trabalha com casos de obesidade e transtornos alimentares, com foco na recuperação da autoestima e da autoaceitação visando a saúde e a qualidade de vida tão prejudicada pelos padrões estabelecidos pela sociedade. Confira na íntegra o artigo que Cristina nos enviou sobre Barbie, boneca ícone da história:
Por Maria Cristina Ramos Britto
Em 2015, Mala Bryan, uma modelo caribenha nascida em St. Lucia, apaixonada por bonecas desde menina, criou uma linha de bonecas negras. Como milhares de crianças ao redor do mundo, na infância, era-lhe dada apenas uma opção: a Barbie, criada em 1959 e produzida pela Mattel. Brinquedo que acabou por se tornar um ícone pop, a boneca rendeu filmes, quadrinhos, jogos eletrônicos e desenhos animados; foi musa de estilistas famosos, que criaram coleções para ela, entre eles, Dior, Armani, Galliano, e também de marcas como Gucci e Levi’s. Barbie teve versões de divas, como Marylin Monroe, Audrey Hepburn e Elizabeth Taylor; além de bonecas inspiradas em seriados, como “I Love Lucy”, e filmes, como “…E o Vento Levou”; Barbie e Ken, seu eterno namorado, ganharam uma versão inspirada em Romeu e Julieta. E virou sinônimo de mulher loura vestida de cor de rosa. Quem nunca ouviu uma jovem com essas características ser chamada de Barbie?
Se cada época tem seus modismos, pautados por mudanças econômicas e culturais, Barbie foi obrigada a acompanhar as transformações sociais que resultaram do processo de emancipação da mulher. Não é exagero dizer que a boneca relutou muito em se tornar independente e dona do próprio nariz, ela praticamente foi obrigada a se modernizar, se quisesse continuar sendo aceita pelas meninas. Se Barbie cresceu e descobriu que podia ser médica, e não apenas uma mocinha casadoura, outros valores permaneceram imutáveis, indiferentes às revoluções pelas quais o mundo tem passado, por décadas.
Sim, Barbie evoluiu, não se pode negar, mas continuou, até bem recentemente, a representar a magreza excessiva, quase anorética, de um corpo de pernas longas e cintura fininha, longe do biotipo da maioria das mulheres. Em janeiro de 2016, foram anunciadas novas versões da famosa boneca: alta, curvilínea e mignon; sete tons de pele, 22 cores de olhos; e 24 penteados e texturas de cabelo.
O século 21 parece ter despertado os executivos da empresa fabricante de Barbie. De acordo com uma porta-voz, as novas versões da boneca refletirão um olhar mais amplo sobre a beleza e permitirão que as meninas possam se reconhecer nelas. Essa mudança seria resultado de uma preocupação com os padrões estéticos irreais da boneca, e a consequência na autoimagem das crianças, ou uma necessidade ditada por questões econômicas, ou ambas?
Seja lá qual for a razão, as novas Barbies significam uma tomada de posição clara no respeito à diversidade. Ao contrário de Mala Bryan e tantas outras meninas que cresceram com uma boneca totalmente distante de sua realidade, as futuras gerações poderão escolher os modelos com que brincar.
Seria um exagero afirmar que Barbie foi responsável por transtornos de autoimagem ou alimentares em adolescentes, pois muitos fatores devem concorrer para o seu desenvolvimento. Mas ela está inserida nas construções de modelos que tornam a mulher tanto sujeito quanto objeto, na medida em que absorve e reproduz os modelos da sociedade de consumo, que inclui as indústrias da moda, da beleza e dos procedimentos estéticos.
Pode-se imaginar que Barbie significou não apenas para meninas fora daqueles padrões, mas para negras, mulatas, asiáticas, um exemplo de estereótipos estéticos, além de comportamentos predominantemente femininos, e não feministas, de submissão, de preocupação com a aparência e a moda, de como ser boa esposa, enfim, de como uma garota deve se comportar.
A mudança, ou melhor, a diversidade de Barbie, não é o fim da história, um final feliz para a boneca e as meninas. A questão vai muito além de uma boneca, quando vários atores, como a mídia, a indústria da moda e a da beleza (cosméticos, procedimentos dermatológicos, cirurgias plásticas) vendem padrões estéticos irreais no cartão ou no carnê em muitas vezes sem juros, mas sem garantia de sonho realizado. Lipoaspirações e rinoplastias desnecessárias, procedimentos estéticos que buscam a igualdade e decretam a morte da beleza diferente, cirurgias plásticas que tentam preencher uma necessidade emocional são reflexo de uma sociedade que precisa se repensar de dentro para fora. Barbies de todos os tipos são bem-vindas. Mas elas são apenas um detalhe da história.
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AME-SE
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As bonecas são lindas! Comprei a Adunni de vestidinho rosa para a minha coleção e amei! =) Bjos.
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Que demais, Bia!!! Ficamos aqui morrendo de amores por todas elas!!! Beijão, querida!!! Boa semana!!!
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